A Bíblia não é um cardápio, é uma bula. Não se pode escolher partes dela; é preciso aceitá-la por inteiro. Essa ideia moderninha de selecionar trechos da Sagrada Escritura e descartar o resto simplesmente não existe.Isso é típico do “cristão cardápio”, que monta seu próprio menu, bebendo sempre das mesmas fontes e jogando o restante fora.
A Bíblia Sagrada é como a bula de um remédio: deve ser seguida integralmente, sem se preocupar com o sabor amargo.As pessoas estão acostumadas a pregações sobre prosperidade, milagres e histórias leves, mas falta ouvir a parte mais dura da Palavra de Deus, que poucos pregadores têm coragem de abordar.
Falta quem pregue sobre a maior qualidade de Deus: a justiça! Deus é, acima de tudo, justo, antes mesmo de ser amoroso, cuidadoso ou misericordioso.Se observarmos os pregadores mais conhecidos e “donos” de denominações religiosas, muitas vezes nos decepcionamos. Um foca no dízimo, outro em milagres, outro em casamentos e comédia. Na boca desses irmãos, o cristão parece nunca enfrentar provações, vivendo em constante alegria.
No entanto, nem tudo está perdido. Ainda existem pastores e padres sérios, tementes a Deus, que pregam de forma edificante e ensinam a Palavra com profundidade. Nomes como Hernandes Dias Lopes, Augustus Nicodemos, Alexandre Ximenes, Renato Torres e Paul Washer são exemplos de quem não busca alimentar egos, mas pregar a Bíblia como bula, por inteiro, com suas contra indicações, posologia e observações.
A teologia da prosperidade tem formado uma geração submissa, fraca ideologicamente, com pouco conhecimento da Palavra de Deus. As missas viraram rituais, atos decorados com homilias quase sempre rasas, que não trazem novidade nem desvendam o verdadeiro significado dos versículos.
Já alguns pastores pegam uma dúzia de pregações, estudam e rodam a cidade repetindo a mesma mensagem. Certa vez, ao final de um culto, precisei alertar um pastor: “O senhor já pregou essa mensagem três vezes nesta igreja, da mesma forma. É uma passagem belíssima, mas está na hora de ampliar o repertório.”
Há, portanto, falhas em ambas as igrejas. É preciso mergulhar na Palavra, sair da mesmice e explicar a Sagrada Escritura de forma simples, direta e compreensível a todos.
Ninguém aguenta mais pregações repetitivas, com explicações superficiais, sem profundidade. É chegada a hora de dar um passo adiante no evangelho e realmente explorar o que está nas entrelinhas.
Outro problema alarmante é atribuir tudo de ruim que acontece em nossas vidas ao diabo. Coincidentemente, nunca temos culpa: se alguém cai da escada, foi o diabo; se quebra um braço, foi o diabo; se pega uma pneumonia, foi o diabo! Nem o “encardido” aguenta mais ser culpado por tudo.
Isso beira o ridículo e chega a fazer apologia ao “coisa ruim”.Ora, foi o próprio Jesus Cristo quem disse: “Eu lhes disse essas coisas para que em mim tenham paz. No mundo, vocês terão aflições; mas tenham ânimo! Eu venci o mundo” (João 16:33). Jesus nunca prometeu uma vida só de coisas boas. Pelo contrário, a Bíblia reforça que somos falhos, pecadores e indignos de salvação.
Fiquemos atentos aos que tratam a Bíblia como um cardápio. Isso é desonestidade, é brincar com a inteligência alheia, é querer se passar por sábio diante dos que pouco conhecem o livro inspirado pela graça de Deus.
Ou acreditamos em tudo o que esse majestoso, sagrado e inerrante livro nos revela, ou é melhor não acreditar em nada. Afinal, Deus vomitará os mornos: “Conheço as suas obras, sei que você não é frio nem quente. Melhor seria que você fosse frio ou quente! Assim, porque você é morno, não é frio nem quente, estou a ponto de vomitá-lo da minha boca” (Apocalipse 3:15-16).
O significado dessa passagem é claro: um ateu que não acredita em nada tem mais chances de ir para o céu do que alguém que crê apenas em partes da Bíblia. Uma explicação mais profunda desse versículo merece um estudo à parte, pois o livro de Apocalipse é um dos mais complexos de se interpretar. Quando um pastor começa o culto pedindo para abrir em Apocalipse, já me animo, pois sei que ali está um estudioso dedicado da Palavra.
Encerro com uma frase do profeta Jeremias, conhecido como o “profeta das lágrimas”. Ele contrariou muitos por dizer verdades que poucos queriam ouvir, sendo preso, surrado e ameaçado durante os 40 anos em que profetizou. Mesmo assim, declarou: “Quando descobri tuas palavras, devorei-as; são minha alegria e dão prazer a meu coração, pois pertenço a ti, ó Senhor, Deus dos Exércitos” (Jeremias 15:16).
Júnior Belchior